quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Capítulo 3. Nomes e definições


Atende por Antenor. Dei-me conta que as devidas apresentações ainda não foram feitas. Uma gafe, é verdade, diante do fato de estarmos descrevendo o dito cujo, falando de sua personalidade e ainda não sabermos sua graça, como poderíamos assim nos tornarmos intímos? Engraçado como saber o nome do objeto de estudo faz com que ele deixe de ser exatamente isso pra nós, cria-se uma intimidade, um rosto e possivelmente até cogitamos que sua cor favorita seja o roxo. Não era, era azul.
Antenor. Esse era o seu nome. Para ele tratava-se de uma ironia. O seu nome, advindo do grego significa adversário. Como nunca fora determinista e só soubera do significado do seu nome já com vinte e três anos, só pôde rir quando leu o significado em um livro de nomes para bebês, sua mãe havia lhe dado o nome que definia a maneira exata de como se sentia, um adversário de si mesmo. Quando questionou sua mãe sobre o nome, ouviu um “ oxi menino, e eu achava que tinha era a ver era com múscia, tenor, num é que se diz? Então, Antenor. Achei tão bonito...” então, sem maiores expectativas, balançou a cabeça e partiu.
Foi mais um fato a que deu pouca importância (apesar de achar curioso) mas, sempre carregou a definição consigo daí pra frente, não pelo simbolismo, mas porque achava que achara a palavra exata para definir a sua bipolaridade.
Adversário. Aquele com que você está em um embate. Se perguntava se nesse jogo estavam ambos perdendo, ele e ele mesmo. A pergunta tendenciosa já predispunha de resposta, apesar de nunca ter dito em voz alta, talvez até o tenha dito, mas com certeza, não ouviu a si próprio. Preferia a dúvida da quase certeza, funcionava assim: achava que acreditava saber da resposta, pelo menos era o que repetia quando olhava com os olhos arabescos o espelho de todo dia, e assim o repetia, deixando deliberadamente o tempo escorrer pelo ralo junto com o cuspe da pasta dental.
O tempo (outro inimigo?) não alterava as regras do jogo. Nem ele. Não sabia o porque, se não queria mudá-las... as compreendia e tinha a leve impressão que sabia disso desde os seus dezesseis anos. Então somava o tempo nos dedos e ria de si próprio com escárnio. Talvez não do tempo passado, mas de constatar que constatava que o tempo havia passado. É, era seu vilão em uma não tão bem elaborada comédia. Era também seu espectador e outro dilema então surgia para si. gostava de o ser mas se ele se assistia, alguém vivia?

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Pausa


Olhou para si
e quis continuar assim
olhando e olhando
então sentiu um estremecimento
e um oceano abriu-se entre ela e todos
na verdade sempre existiu esse distanciamento
porém, só agora sentira seus cabelos molhados...

Capítulo 2. Sobre o passar dos dias e o café.



Pensava nos anos que passaram e que continuavam passando. Levava os dias assim, fazendo o que lhe desse na telha, ou não, às vezes era apenas arrastado pelos dias mesmo, nesses não se sentia tão bem, gostava de aproveitar o ócio, quando sentia que até isso perdera, sentia-se deveras frustado. No entanto, no dia a dia não se aborrecia e não tinha maiores preocupações. Sabia fazer bom proveito do seu ócio que a sua fácil vida lhe proporcionara. Era estudante. Era estudante bancado pelos pais, que não eram ricos, mas a quem ele sabia que não estava dando grande trabalho, então não se importava tanto sobre o seu peso sobre outrem, no fundo sentia uma leve culpa, sim sentia isso, afinal criado na sociedade ocidental não conseguia tirar de si todas as morais cristãs e devia ter dentro de si algo além do seu grande ego. Fazia sua parte evitando pensar nisso e se reconfortava novamente com sua condição de estudante bancado. Assim vivia bem apesar de.
Quanto a sua única função, desempenhava-a porcamente, nunca teve problemas reais com os estudos mas nem por isso era um aluno exemplar, aliás preferia não ser, assim dava-se ao luxo de passar despercebido, não era preciso ser posto a prova, evitava este confronto direto, podia passar de forma esquiva, sem brilho, mas também sem manchas. Era uma espécie de segurança que garantia a si mesmo. Das poucas vezes que parou pra pensar em suas qualidades intelectuais notou que nunca se considerou inteligente, mas nem por isso era visto como burro (ou se achava), era simplesmente indiferente, (ou se achava).
Aprendia para si ( ou assim achava), o resto dos conhecimentos que eram úteis as instituições de ensino apenas transitavam em sua cabeça e sumiam, fora assim no colégio também. Essa fora sua vida de estudante e ainda era.
Gostava de ler. Por isso acho que não se achava burro, conseguia ir tirando proveito de todas suas leituras, sugando este ou aquele pensamento para formar o seu, não se importava em ser um parasita mental, acreditava que todos o eram, achava que a inteligência verdadeira, aquela que é a verdadeira criadora, aconteceram muitas poucas vezes na humanidade, o resto fora desenvolvimento de uns três pensamentos únicos, ou sete, como os pecados capitais. Pensamento um, desenvolve, dois, três, quatro, contraria, cinco, desenvolve, seis, sete, oito, contraria, nove. Fora assim com a sapiência da humanidade, era assim com sua própria. Então gostavade se sentir capaz de misturar pensamentos e constituir algo em sua mente como quem faz um bolo, ou um pudim, um pudim de café: ovos, leite condensado, calor e café. Voilá. Essa era sua percepção de si, era um pudim, feito dos ingredientes coletados no seu processo de aprendizagem que era sua vida. Nesse estranho processo era confortável a si saber que ele não precisava ser isso por toda a vida, podia sempre digerir a si próprio e manter algo, talvez os ovos, e se tornar algo salgado, uma salada de maionese. Isso lógico, se almejasse tal, se mais do que querer tivesse a devida força de vontade para tal. O problema não era conseguir os novos ingredientes, era o antes disso. a autofagia sempre foi um processo delicado. O bolo fecal então...

domingo, 14 de setembro de 2008

Capitulo 1. Sobre o tanto faz e a descoberta da sua má índole.


Sabia que tinha que fazer algo. Realmente sabia. Mas não o fazia, tanto por falta de imaginação como por falta de vontade mesmo. Por uma questão física, gastava sua energia mecânica mastigando tampinhas de canetas. Era excelente, recomendava-se para si mesmo sempre, tanto pra passar tempo, como para passar a ansiedade da falta do que fazer e do excesso de não fazer nada.
Não era o fato de não mover-se que o incomodava, não era naturalmente passivo, era um certo tipo de movimento que parecia que não conseguia fazer. Era o não conseguir fazer qualquer coisa que fosse que o fazia matutar.
Gostava de dançar, de brincar, de andar, de muitas coisas, desde que fosse sem rumo e sem propósito, se fosse para fazer cooper, não se animava, cuspia um certeiro “não, obrigado”. Agora, se se tratasse de um passeio, sem eira nem beira, sem vamos até aquele pontinho seguindo aquele caminho, sabia-se de antemão que podia contar com ele. Era como era.
Talvez fosse o propósito das coisas que ele achasse infundado, bestas demais pra motivá-lo, desconfiava do que tinha que ser feito e olhava torto para quem quisesse dar pitacos sobre sua vida. “Preguiçoso” pensavam... talvez fosse pura preguiça mesmo.
Preguiça, no sentido de não querer fazer! Aversão mesmo e uma certa insensibilidade moral. Disto não se incomoda, até sentia uma pontinha de orgulho de se permitir ser insensível desta maneira tantas e tantas vezes. Independente de dizerem a ele que fosse necessário fazer, inevitável, para viver, para o sei lá, para o que fosse!
não se incomodava, se incomodava com a força mental que as vezes precisava fazer quando queria fazer algo e não fazia simplesmente por não fazer, como por exemplo para ir pra um curso ou uma festa e no fim das contas acabar desistindo no meio do caminho e ficando na biblioteca ou no cinema ou ainda sentado em sua cama olhando para o teto e esperando o tempo passar até se tornar impossível a sua ida. Incomodava-se com o turbilhão de sentimentos que o atingia a essa hora, a desordem em si mesmo, o misto de arrependimento com raiva e alguma felicidade perversa de ter sido vencido por si mesmo. Sabia que isso acontecia, não conseguia deixar de observar e não negava para si mesmo esse censurável sentimento. Era como se sentir sordidamente imundo e ficar satisfeito por isso.
Enxergava-se como desleal consigo mesmo. Como poderia ficar contente com sua própria perda pra si mesmo? No entanto ficava, e internamente um sorriso sacana, sem que ele quisesse, se esboçava.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008


Nos meus dez anos não fiz nenhuma outra reflexão a não ser a de que eu me sentia velha. Não como quem acha que está mais perto de saída do que da chegada, não se trata desse sentimento, mas sim daquele de quem olha pra trás e acha que deixou o tempo passar.
Olhei o céu laranja, não o azul, esse do dia inteiro... o céu do crespúsculo, o céu poético que permite os suspiros e aconchega nosso corpo na areia quando olhamos o branco das ondas do mar e deixamos os pensamentos irem mais além. Enfim, olhava para cima e pensava em como a gente pode mudar tanto e não mudar nada ao mesmo tempo. Como cachorro que anda em voltas antes de deitar naquele mesmo lugar, desse mesmo jeitinho sentia que levava a vida, com altos e baixos, como quem anda de balanço e por mais que esteja se movendo está sempre revisitando os mesmos pontos.
Por isso me sentia velha, cansada de balançar de um lado a outro, não queria mais brincar e por onde olhasse não via melhores alternativas, rodar no roda-roda, subir e descer na gangorra, ou mesmo que fosse o escorregador, subir escadas e escorregar de formas repetidas, não pareciam ter objetivo... E foi por isso que me dei conta, ninguém mais estava perguntando isso, estavam todos de bom grado na sua ciranda então algo tinha que ter acontecido a mim.
O problema era justamente esse eu não queria ter que optar por um brinquedo como todos os outros, eu queria poder ficar parada olhando o mar por exemplo mas até pra isso se tem hora...

eu? com meus dez anos, estou velha e cansada de relógios.